Quase 50 anos depois do desaparecimento que chocou o meio musical brasileiro, restos mortais do pianista Tenório Jr. foram identificados por peritos argentinos. A confirmação, realizada por comparação de impressões digitais pela Equipe Argentina de Antropologia Forense (EAAF) e autoridades judiciárias, devolve ao país a certeza de um crime cometido no marco da repressão que antecedeu o golpe de 24 de março de 1976 na Argentina.
Tenório Jr. estava em Buenos Aires em meados de março de 1976 para acompanhar a temporada e turnê de Vinícius de Moraes e Toquinho. Depois de uma apresentação no Teatro Gran Rex, o pianista saiu do hotel na madrugada de 18 de março e não retornou. Posteriormente descobriu-se que ele fora detido por agentes do aparato repressivo, assassinado e enterrado como desconhecido em vala comum na periferia de Buenos Aires.
A identificação dos restos foi possível graças a um trabalho forense que envolveu a EAAF e a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP). As análises concluíram que Tenório Jr. foi morto por ferimentos de arma de fogo entre 18 e 20 de março de 1976, poucos dias antes do golpe que instaurou uma ditadura militar responsável por milhares de desaparecimentos e execuções. O caso, segundo especialistas e veículos que acompanharam a identificação, insere-se no contexto transnacional de repressão conhecido como Operação Condor, a aliança repressiva que coordenou perseguições entre ditaduras sul-americanas naquela época.
Organizações de direitos humanos e familiares pedem que a identificação desencadeie investigações que esclareçam os responsáveis, não apenas os executores materiais, mas também possíveis vínculos entre esferas de poder regionais no contexto da Operação Condor. A EAAF e promotores argentinos seguem trabalhando em casos de violações de direitos humanos da ditadura, e a família de Tenório solicita que se apure toda a cadeia de comando envolvida.
Para o Brasil, a confirmação da morte de Tenório Jr. é também um lembrete doloroso de que a violência política transnacional atingiu civis e artistas, e que a busca por verdade e justiça é um dever intergeracional. A APUB, comprometida com memória, justiça e verdade na contínua construção da democracia, defende a abertura de investigações e responsabilizações, além da preservação da memória de Tenório: sua obra, sua história e a história das vítimas da repressão precisam ocupar espaço nas narrativas públicas para que episódios como esse não se repitam nem caiam no esquecimento.
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